"In the 20th century, the United States endured two world wars and other traumatic and expensive military conflicts; the Depression; a dozen or so recessions and financial panics; oil shocks; a flu epidemic; and the resignation of a disgraced president. Yet the Dow rose from 66 to 11,497." - Warren Buffett
Vivemos em tempos agitados. Fechados em casa, isolados socialmente e com receio. Receamos o que o futuro pode trazer à nossa saúde e à saúde da nossa economia e dos nossos postos de trabalho. Ter medo do desconhecido está encriptado no genoma humano e tem sido essencial para a nossa sobrevivência várias vezes no passado. Contudo, esta tendência que demonstramos para nos refugiar ou fugir também tem estado na origem de decisões emocionais, precipitadas e que nos trouxeram alguns males. Esta realidade é facilmente compreensível em poucas palavras: nós temos medo do que não conhecemos.
Sendo este o caso, como plataforma que promove a literacia financeira, sentimos o dever de partilhar o nosso conhecimento e colocar em perspetiva como é que crises, epidemias e correções nos mercados financeiros, semelhantes às que vivemos hoje se comportaram no passado. Ao fazer isto, pretendemos equipá-lo, caro leitor, com o conhecimento e confiança necessários para navegar esta tempestade, e tantas outras que virão. Tal como uma nau equipada com boas velas e marinheiros experientes, um investidor verdadeiramente diversificado com um horizonte temporal de médio-longo prazo e bem informado estará sempre precavido, em vez de receoso, e posicionar-se-á para beneficiar das oportunidades atrativas que estes períodos de tempestade criam.
A situação em que estamos:
Enquanto escrevo, percorro o ‘mar vermelho’ que é a performance dos principais índices acionistas mundiais, desde o início do ano. Eis o que encontro:
- DAX (índice do mercado acionista Alemão) está a descer 27%
- FTSE100 (índice do mercado acionista Britânico) está a descer 27%
- Dow Jones (índice do mercado acionista Americano) está a descer 26%
- Shanghai Composite (índice do mercado acionista Chinês) está a descer 10%
- 10 year UK Guilt (Dívida Soberana Britânica) está a subir 6.5%
- 10 year US Treasuries (Dívida Soberana Americana) está a subir 9%
- O ouro está a descer -0.50%
- O petróleo (Crude WTI) está a descer 61%
Mais surpreendente do que a queda em si tem sido a velocidade sem precedente com que a mesma aconteceu. O nome ‘bear market’ refere-se a uma queda de 20% ou mais desde o último ‘topo’ do mercado e como se pode ver no gráfico seguinte, o ‘bear market’ causado pelo Covid-19 foi o mais rápido alguma vez registado:
Para aqueles que negociaram durante a crise financeira de 2008, esta queda nos mercados acionistas pode parecer ainda mais dolorosa. A principal conclusão que retiramos do gráfico anterior é que os mercados NÃO estavam preparados para esta pandemia global. Esta conclusão é-nos evidente dada a agressividade no ajuste das expetativas de mercado, que passaram de otimistas para extremamente pessimistas, o que resultou nesta correção drástica e repentina.
Pondo em perspetiva:
É sabido que investir envolve riscos e que, apesar de alguns investidores negligenciarem esta dura realidade, especialmente durante períodos de baixa volatilidade e subida generalizada no preço dos ativos, temos muito a beneficiar quando procuramos perceber com que frequência é que estas quedas nas principais bolsas mundiais acontecem. Importa então distinguir os seguintes conceitos:
- Correções de Mercado: decréscimos de 10% ou mais num preço de um ativo, desde o seu último topo;
- Bear Market: decréscimos de 20% ou mais num preço de um ativo, desde o seu último topo.
Com fins educativos, beneficiemos do exemplo do mercado acionista Americano (S&P500), para o qual dispomos de dados desde 1928. Dados compilados pelo website Yardeni Research (https://www.yardeni.com/) mostram que entre 1928 e 2019 já se registaram:
- 33 Correções de mercado, com uma perda média de 13.26% e que se prolongaram durante 118 dias (incluindo fins-de-semana e feriados)
- 20 bear markets, com uma perda média de 37.28% e que se prolongaram durante 360 dias (incluindo fins-de-semana e feriados)
E durante o mesmo período…
O S&P500 cresceu a uma taxa anual média de 10%. Afinal, saber um pouco de história sempre ajuda.
Períodos de recuperação passados:
Como o leitor pode concluir do gráfico anterior, de uma maneira ou de outra, fomos sempre capazes de recuperar de todas as correções de mercado/bear markets que nos assombraram. É também de primordial importância salientar que tais resultados apenas puderam ser alcançados uma vez que os investidores não venderam perto dos fundos do mercado cada vez que houve uma queda, o que é exatamente o que a nossa natureza humana nos diz para fazer. Perceber isto é perceber porque é que nós frisamos sempre a importância de ter uma perspetiva de longo prazo.
De seguida, importa responder à pergunta “quanto tempo é que vai durar?” – Não sabemos. Ninguém sabe - e sugerimos que o leitor fuja sempre que alguém afirme saber a resposta. O que devemos então fazer? Estudar a história e colocar os acontecimentos recentes em perspetiva. O gráfico que se segue é cortesia da Visual Capitalist (https://advisor.visualcapitalist.com/black-swan-events/):
Conclusão: quebras nos preços dos mercados acionistas tendem a acontecer de forma rápida e agressiva – enquanto as recuperações são morosas e mais suaves.
O benefício de comprar/não vender a preços baixos:
Como referido anteriormente, faz parte da nossa natureza querer liquidar a nossa carteira de investimentos quando nos parece que o mundo está a desabar – mas ter a capacidade e sabedoria de não o fazer aumenta a probabilidade de alcançarmos bons resultados financeiros.
O mesmo não pode ser esperado quando vendemos perto do fundo do mercado e não voltamos a entrar, ou apenas voltamos a entrar perto do topo, que é quando a maioria dos retornos positivos já foram feitos e o binómio risco-retorno que o mercado nos dá deixa de ser tão favorável. Isto pode vir como uma surpresa para alguns leitores, mas os mercados financeiros não funcionam como um casino gigante, que é jogado por gamblers cheios de adrenalina. Se tivéssemos de tentar definir o que são os mercados acionistas, diria que: “são o mecanismo através do qual um grupo de investidores compra o valor atual de uma série de cash-flows futuros’. Em termos mais simples: é expetável que as empresas venham a gerar lucros no futuro. Nós não sabemos quanto é que estes lucros serão, mas sabemos o preço que pagamos ‘hoje’ por estes lucros futuros. Logicamente, aqueles que são capazes de comprar estes lucros a preços mais baixos irão ter uma performance superior aos que compraram a preços mais elevados.
Dito isto, a próxima tabela (retirada do https://theirrelevantinvestor.com/) mostra-nos, sem surpresas, que quanto maior a correção de mercado/bear market, maior são os retornos médios anuais que os investidores experienciam nos 3/10/20 anos subsequentes. Para quedas entre 25% e 30%, o retorno médio anual nos 3 e 10 anos seguintes tem sido de 8.5% e 6.9% respetivamente:
Para os leitores que não estão habituados a pensar em termos de juro composto, vejam que uma taxa anual de 7%, em regime de juro composto, faz com que o nosso investimento inicial praticamente duplique a cada 10 anos.
Conclusão:
Todos os investidores deveriam ter como objetivo comprar barato e vender caro, não o contrário. Após ler este artigo, esperamos que o caro leitor se sinta melhor equipado e preparado para navegar este e outros períodos de volatilidade exacerbada, agora que percebe melhor o quão prejudicial pode ser liquidar o seu portfólio de investimentos durante/após estes períodos de quedas acentuadas.
João Feliciano Martins
ASCI, IAD, APP
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